Hoje, em meio a goles de um expresso aromático e encorpado, conversava com meus colegas do inglês. Perguntaram-me do que se tratava os arranhões na minha testa.
Respondi muito sinceramente que havia sido atingido por um tijolo. Reações enérgicas e de espanto, como era de se esperar. Aliás, ser atingido por tijolos no rosto soa mais como um roteiro de filmes da estirpe de "Premonição". É, no mínimo, tosco.
Pois bem. A conversa foi se desenrolando, até o ponto em que relatávamos histórias de conhecidos que quase morreram. O assunto seguinte foi "mortes bestas" (termo, por sinal, bastante sarcástico). Algo como escorregar enquanto se lava o banheiro, bater e cabeça e um abraço. Ou como brincar de ninja em cima de um muro e... outro abraço. Chegamos à conclusão de que a vida é frágil.
Fisicamente falando ela é realmente frágil, basta um órgão do corpo parar para que a vida biológica se esvaia. Muito simples. Mas do ponto de vista social, ela é muito mais frágil e muito mais maléfica se for tirada, e seu poder de influência sobre outras vidas é ainda maior.
Meu ego não falha. Não ando pelas ruas pensando se vou ser ou não atropelado, ou sequestrado, ou assaltado sob a mira de uma arma. Realizo minhas atividades cotidianas convicto de que vou acordar no dia seguinte, dar bom dia aos meus pais e tomar o primeiro café do dia.
Mas ao tomar uma tijolada na cabeça, pensar "Ahhh, se eu estivesse mais pra esquerda..." se torna inevitável. Os ses surgem do nada, invadindo todas as minhas percepções do que faço diariamente.
Somos surpreendidos pelo acaso todos os dias, a todo instante. Um passo em falso pode significar um dente quebrado. Uma diferença de centímetros na minha posição determinou alguns arranhões, e não pontos no meio da cabeça.
E essa reflexão me trouxe outra: quanto vale uma vida ?
Levamos anos para construir amizades, paixões, para alcançar metas, para traçar objetivos. Todos os momentos se unem numa longa vida, que pode desaparecer num piscar de olhos, sem dar satisfação nem pra onde vai nem de quando vai voltar.
Basta a um homem apertar um botão e lá se vão milhares de vidas. Vira estatística crua. Morre gente a todo instante. Nasce gente a todo momento. Às centenas, aos milhares, ou ainda às centenas de milhares. Milhões são miseráveis famintos e se vivem ou não é algo realmente questionável.
Nossa passagem por aqui é, ao mesmo tempo, efêmera e demorada. E pode passar despercebida, tanto pelo eu como pelo outro.
Atribuir valor a algo tão vago e multifacetado como é o conceito de vida é bastante complexo, principalmente vindo de um pretenso economista. Mas, independente do que seja o valor, somente espero dá-lo em generosas doses à minha vida, ao menos até uma possível próxima tijolada.
4 comentários:
Nossaaaaaaaaa, foi um tijolo mesmo?! Muito Premonição!!!
Bom, ainda bem que foram só uns arranhões...
A vida te tirou da zona de conforto pra te lembrar que ainda vive e que o coral ainda existe, viu mocinho?! hahhahaa
Bjão
nao sabia que vc tinha um bolg. e nem que escrevia tao bem assim !
quem sabe um dia vc rouba a coluna que a lya divide com o kanitz na veja.
ps. o kanitz patrocina nossa biblioteca e tem uma discussao no mankiw de quanto vale uma vida. mankiw este que eu preciso devorar para a prova de eco.
te adoro, gab. virarei uma assídua leitora sua =**
escrever é uma forma de não passar despercebido ;-)
descobri isso este ano!
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