segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Do respeito e da pesca pobre

Uma vez mais pude comprovar a minha inépcia na arte de pescar.
Parece fácil, basta colocar a isca no anzol e lançá-lo à água, esperando que o pedaço de isopor dê algum sinal positivo. Mas minha contribuição ao montante de peixes no final da tarde fica só no ato de cavocar a terra e dela tirar algumas minhocas.
Passar tardes com os avós é recompensador, para dizer o mínimo. Ouvir suas histórias, suas palavras de sabedoria...
"É preciso fazer silêncio, senão o peixe não vem, filho."

Atentamente observava a habilidade com que meu avô manejava a vara de pesca. Como numa dança, olhava, tirava e recolocava na água as sete varas com que pescava simultaneamente. Pescar para ele é um descanso, um repouso. Por mais que os peixes não venham, ele ficaria sentado à beira do rio, lançando suas varas.

Tudo completava a pintura, o quadro que compunha a cena. O vento batendo na superfície da água, esboçando leves ondas, numa simetria quase geométrica, o som das aves nos céus, a canção entoada e o Sol de fim de tarde, que pintava nas nuvens tons de vermelho e laranja.
Ah...que delícia estar ali, sentindo na própria pele a efemeridade e a eternidade de uma tarde diante de um rio. E era isso que era, uma tarde diante de um rio, nada mais que uma tarde diante de um rio.

"E então, filho, como está a faculdade?"
"Ah, vô, tá bem, normal."
"Hm...você tá fazendo francês né?
"É."
"Tá gostando? Olha o peixe na sua varinha."
"Tô gostando sim. Ah, droga, perdi..."
"Você puxou muito rápido, tem que esperar ele prender a boca na anzol."

Puxei tão rápido a vara da água que o anzol enganchou numa árvore atrás de mim. Enquanto desfazia o trabalho porco, meu avô tirava mais três tilapias dos anzóis. Era como se ele soubesse o momento exato, como se enxergasse através da água escura da represa. Devolvera um dos três, sob o argumento de estar muito novo.

"Então filho, aproveita agora essa época pra fazer as coisas que você tem vontade."
"Ah sim vô, estou aproveitando."
"Porque depois, quando você for ver já foi. Quando você chega no fim da vida é que vê o quanto deveria ter feito."

Parou por ali. Eu não tinha o que dizer, fiquei apenas aproveitando o momento.

"A bondade é o princípio do tato, e o respeito pelos outros é a primeira condição para saber viver" - Henri Frédéric Amiel


E hoje, data dedicada aos pais, a família se reuni para um almoço na casa dos avós. Foi, como sempre, um almoço como outro qualquer. Em verdade, pouca diferença faz se nos reunimos num dia das mães, num dia dos pais, num Natal ou numa Páscoa. A cena é sempre a mesma, os papéis se repetem, vontades são suprimidas. É irritantemente visível o tratamento que dispensamos a nossos pais e avós.
Aos dias determinados pelo calendário correspondem ações determinadas pelo bom senso. Portanto, no dia dos pais, desejamos a nossos pais um feliz dia dos pais - e assim sucessivamente. Correspondem também reuniões familiares (longe de se caracterizarem como tal). Quem faz a comida é a avó, quem senta na cadeira da ponta é o avô. Mas quem se serve primeiro é quem consegue.
É absolutamente impressionante o fato de ninguém se preocupar em, ao menos, verificar como estão meus avós. Se estão sentados, se estão com talheres, com copos. Se querem arroz, se querem um pedaço do frango, se querem algo mais. Não. Todos correm buscando garantir suas próprias porções de alimento. Servir? Ver se está tudo bem?

Talvez esteja exagerando, talvez esteja me colocando como "aquele que entende das coisas". De fato, posso não conhecer a relação de meus avós com meus tios (relação que tem o dobro da minha idade, diga-se de passagem). Mas reparo no que vejo, e o que vejo são demonstrações de desrespeito e até descaso em algumas circunstâncias.
Não sei se posso soltar a máxima do "não se respeitam mais os mais idosos". Fato é que o que costumo ver nos almoços de família é, para usar de eufemismos, incômodo. Falo pelo meu caso, por aquilo que conheço, longe de querer soar universal. Mas a coisa parece se reduzir a um "feliz dia dos pais" e a um presente. Os pais merecem muito mais do que isso, os avôs merecem o dobro. Respeito é o mínimo, e sempre vai bem uma pitada de consideração e preocupação.

Deveríamos aprender mais com os mais velhos. Deveríamos respeitar mais os mais velhos. Sobretudo quando o velho é seu pai.
Esse pode ser o último dia dos pais que passamos todos juntos.

2 comentários:

Déia disse...

Você realmente vê alem das coisas, sente além do universo e diz o que seu coração manda!

Aproveite, cuide e respeite seus avós..
Seus tios parecem não ter a idade mental igual a cronológica, ou não possuem valores como os teus!

Vc é especial e só por isso tente mudar um pouco as coisas que pode.

Quase ninguem percebe que o bom, não é a homnenagem, mas sim o homenageado.. dar um presente Bahhh, pode ser feito por qquer um... estar presente de verdade, é para poucos!
Estou no seu barco e no seu desabafo!
bj

Dani disse...

Olha, gostei mto do seu texto, pois vc descreve um momento simples (o da pesca), mas que com certeza é mais especial que qualquer homenagem falada!
Infelizmente, eu não tive oportunidade de conhecer os meus avós, sinto-me carênte deste tipo de relação, além da falta de toda esta sabedoria, paciência e amor!
Realmente, são tolos aqueles que não valorizam e não repeitam...