"Na vida pessoal
O professor de Psicologia da Universidade de Harvard Daniel Gilbert tem uma teoria bastante interessante sobre por que tendemos a deixar escapar tanta expectativa pelas frestas dos nossos desejos. Segundo ele, tentamos o tempo todo prever os acontecimentos da vida. Desde o momento que abrimos os olhos de manhã conjecturamos como será nosso dia no trabalho, o trânsito, o encontro à noite. E, de acordo com Gilbert, isso traz um ganho para a sensação de felicidade.
Antecipar nossos prazeres é uma forma de prolongá-los. Começar a pensar naquela festa uma semana antes nos permite “experimentá- la” por sete dias, em vez de curti-la só no sábado. Prever a viagem de férias é uma forma de se entregar ao merecido período de recesso antes mesmo de bater o ponto e pegar o avião (além de ser um estímulo a mais para as horas de trabalho, claro).
A ressaca desse processo, porém, é que não somos muito bons em prever nada realisticamente. Assim, quando começamos a pensar na festa uma semana antes, vamos criando uma expectativa grande sobre ela, achando que vai ser um momento de alegria genuína. No entanto, quando a festa chega, ela pode nem ser tão legal assim – e aí o sentimento de frustração vem à tona.
“Os acontecimentos futuros que nossa mente antecipa como grandiosos são frequentemente uma grande decepção”, escreve Gilbert no livro O que nos Faz Felizes. E isso vale, óbvio, não só para festas, mas também para os relacionamentos, empregos, objetivos de vida. “Como não conseguimos prever o quão felizes nos sentiremos com algum acontecimento futuro, criamos uma série de fantasias sobre nossa concepção de felicidade.” E elas, na grande maioria das vezes, não se concretizam. Aí, haja decepção!
Mas, além de inevitável, criar expectativas é indispensável para nos motivar a viver. Mesmo que muitas vezes quebremos a cara com as ilusões que criamos, sem elas seria difícil levantar da cama de manhã. Se você não imagina que seu dia possa ser bacana, dificilmente vai querer enfrentá-lo. Ou se já esperar que a festa vai ser ruim, não vai encontrar uma razão sequer para se motivar a ir. Sem expectativas, nos tornamos apáticos, sem vontade. Exatamente o mesmo sentimento que acomete os que sofrem de um mal como a depressão, por exemplo, quando tudo parece desinteressante e desanimador.
Esse é o resultado, também, de decepções que enfrentamos ao longo do nosso caminho. Algumas parecem ser tão doídas que nos deixam sem qualquer fio de esperança. Principalmente quando nos decepcionamos com nós mesmos. Porque daí, além de enfrentar a desilusão, temos que encarar também a culpa. “Por que fui apostar tanto nisso?” “Eu sou mesmo um idiota de ter acreditado naquilo.”
A saída, nesses momentos, é tentar desanuviar a mente e perceber a constatação humilde e realista dos fatos. Sem exageros, sem estardalhaços. Assim, as dimensões de uma decepção como essa se reduzem às de um fato totalmente possível a pessoas normais como eu e você, que não temos obrigação (nem possibilidade) de ser perfeitas. Então, dê-se um desconto. Criar expectativas não é uma escolha, mas um caminho que temos que seguir. O melhor a fazer é aproveitar o trajeto da forma mais tranquila e plena. Assim, a chegada tende a ser sempre compensadora."
Essa foi a quinta e última parte da série. E também a que mais elucida, na minha opinião.
Nunca tinha parado pra pensar no que disse o professor de Harvard. Digo, já tinha me dado conta de que antecipo o que acontecerá ao longo do dia, mas nunca tinha relacionado isso com "ganho para a sensação de felicidade" ou como prolongamento da sensação de prazer. E, por extensão, isso afeta todo o conjunto da obra de que trata esta série.
O exemplo da festa foi mais do que ilustrativo. Tudo começa já na propaganda da festa: "Open Bar de blá, blá, blá, blá! Performances ao vivo! Mulheres vip até a meia-noite!", e por ai vai. Conjectura-se todo o andamento da festa, planejam-se falas, olhares, abordagens. No dia da festa, come-se bem, toma-se um banho mais caprichado, utiliza-se o perfume empoeirado e a roupa bonitinha. Com tantas preliminares, a coisa deveria ser boa. No entanto, ao menos no meu caso, observo o contrário. Haha. E quando me perguntam como foi a festa, brado afirmando ter sido "muito loca".
É engraçado na verdade...agora vejo o quanto sou metódico no meu trato com o dia-a-dia, talvez em função de estar dentro de uma rotina ou talvez em função da invenção do relógio. Planejar o dia se tornou natural e criar expectativas sobre esse planejamento se tornou automático. Sei que todo o dia pego o jornal na portaria da faculdade, e todo dia espero a mesma reação do porteiro. Sei que ao chegar em casa vou sentar no sofá e teimosamente circular pelos canais da televisão, e todo dia espero encontrar algum programa interessante.
Prego tanto o desapego, a despreocupação com o tempo, a vivência do presente, o já desgastado carpe diem, mas faço tanto o contrário...sempre tentarei me lembrar que antecipar felicidade também pode significar adiar e potencializar sofrimento. Se a felicidade vir, devo aproveitá-la enquanto durar, pois as coisas acontecem quando acontecem e é assim que é. Mas se o sofrimento vier, devo suportá-lo enquanto durar, pois as coisas acontecem quando acontecem e é assim que é.
Gostei da passagem "criar expectativas não é uma escolha, mas um caminho que temos que seguir", na minha opinião a melhor do texto.
ps. Os textos foram retirados de http://vidasimples.abril.com.br/edicoes/079/grandes_temas/conteudo_450012.shtml.
2 comentários:
Eu acho que se soubermos antecipar sem viver esse antecipação como verdade absoluta...as coisas tornam-se mais fáceis.. E depois se o real não foi aquilo que fantasiamos, também não devemnos nos acabar...nos maldizer, nos abandonar...
As coisas simplesmente são...muitas vezes sou eu quem faço a festa, faço os lugares se tornarem melhores ou piores dentro de mim!
Puxa vida...
Todos esses pensamentos somam com o que ultimamente tem me tirado o sono! Como é dificil (pelo menos pra mim) lidar com isso!!
Aii.. me pego repetindo: "É preciso estar distraído e não esperando absolutamente nada. Não há nada a ser esperado. Nem desesperado." - quem sabe um dia absorvo de vez!
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